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terça-feira, 27 de setembro de 2016

NUNCA IMAGINEI



Tudo estava branco. 
A única coisa que eu lembrava da noite anterior foi uma briga horrível que tive com a minha esposa, Jenna. Ela segurava uma faca na mão e gritava comigo após descobrir que eu a traia com sua irmã, Célia. Após isso, só lembro de estar deitado no chão, sangrando e ela pedindo desculpas pelo que fez.
E agora estou aqui. Não sei se isso é uma sala, um corredor, ou algum lugar no além. Não sei se morri. Eu nunca acreditei em vida pós morte na verdade, mas o que será isso?
Comecei a caminhar sem rumo. Acho que se passou 1 hora ou mais, se é assim que se conta no mundo dos mortos, até que ouvi uma voz... Bem de longe podia ouvir alguém chamando meu nome, Barty. Nunca senti um frio na espinha tão grande, era como se algo morto, gelado, me chamasse. Mesmo assim continuei andando, não porque eu queria, minhas pernas tinham tomado vida própria. Aquilo sempre acontecia, eu era muito curioso, e em circunstâncias como essa, eu andava ao menos sem perceber, mas dessa vez era diferente. Eu não estava nada curioso, eu queria parar, não entendia porque aquilo estava acontecendo. Era como se algo me puxasse e eu não conseguisse controlar. 
Eu tentei correr para o lado contrario, mas era como se minhas pernas não pertencessem mais a mim. Será  que era algum efeito do mundo sobrenatural?
Agora eu estava em uma sala ampla, vazia e eu a vi. Lá no fundo da sala, de costas uma linda mulher com seus cabelos longos e soltos, vestida até os pés com um vestido branco. Era minha esposa. Reconheceria ela em qualquer lugar, de qualquer forma, mas dessa vez ela estava estranha, diferente. Sua voz estava seca, sem vida, estava mais magra que o normal, e parando para perceber agora, seus braços estavam em carne viva. Meu coração acelerou. Será que ela também tinha morrido? E se tivesse, porque ela está dessa forma e eu não, já que foi ela quem me matou.
Tentei chamar seu nome, mas não saia voz da minha garganta, aquilo era agoniante.

- Barty, Barty meu querido. - ouvi Jenna me chamar. Com certeza algo tinha mudado, eu precisava saber.
- Jenna meu amor, me perdoe por tudo. Eu não sabia o que estava fazendo, foi um mero acidente. Você tem que me perdoar. - supliquei.

Jenna começou a rir. A risada cortou o ambiente igual vidro caindo no chão. Foi excruciante.

- Barty meu querido. - ouvi Jenna dizer, ainda rindo, meu estômago embrulhava. - Sabe onde nós estamos? Acha que merece o meu perdão? Não existe perdão para quem está morto.
- Morto? Na verdade, eu já imaginava... Você que me matou Jenna? Por causa de uma traição? Você não poderia ter me perdoado? Poderíamos ter resolvido tudo, e estaríamos agora com nossa filha, em casa, em paz.

Nesse momento eu me dei conta de que tinha esquecido totalmente de Agatha. O que será que tinha acontecido com ela? Será que Jenna também a matou? Não era possível! Que tipo de mãe seria ela? Até entendo que minha esposa tivesse me matado, mas não a nossa filha. Jenna ainda ria.

- Não se preocupe com Agatha. Ela está bem, está aqui conosco. Nada melhor que a família reunida. - disse Jenna

E ela finalmente se virou. Não sei se susto é a palavra para definir esse momento. Talvez nojo e repugnância definam. A barriga de Jenna estava aberta, eu podia ver sua caixa torácica quase por completo, seu vestido estava todo manchando de vermelho. Seu rosto desfigurado, ela já não tinha mais um olho, seu nariz já não existia e era possível ver o formato exato da sua mandíbula. Senti uma enorme vontade de vomitar. Se eu estivesse vivo, com certeza vomitaria, mas acredito que isso não aconteça com os mortos. 

- Gostou? - ela me perguntou com um sorriso sarcástico.

Engoli seco. As palavras sumiram da minha boca, não soube mais o que pensar, o que falar. O que teria acontecido com ela?

- Sabe Barty... Depois de eu descobrir que você se divertia com a minha irmã, você sabe, te dei uma facada no coração. - ela riu baixinho. - Logo depois, peguei Agatha e sai de casa. Sofremos um acidente, batemos o carro e agora estamos aqui, com você. Você quer vê-la?
- Agatha querida, venha falar com seu pai. - disse Jenna. O rosto dela expressava vingança, ódio. 

Ela queria me fazer sofrer, eu sabia disso. Por uns instantes eu pensei que iria desmaiar, mas sensação se tornou ainda pior quando eu a vi, do outro lado da sala uma porta de abrindo, e dela saindo Agatha, com o rosto tão desfigurado quanto o de Jenna. Seu rosto estava encharcado de sangue, sua boca não tinha mais dentes, sua bochecha estava em carne viva, e ela sorria para mim.
Minha visão embaçou, tudo o que era branco ficou preto, e eu só ouvia uma risada longe, e Agatha dizendo com uma voz tão fria quanto a de Jenna:

- Bem vindo Papai. Estávamos esperando você, se prepare para pagar pelos seus pecados.


Conto por: Isabelle Freire

Um beijo, Izzy.




Um comentário:

  1. Ual! Me veio uma emoção súbita. Parabéns pelo conto Isabelle, sucesso pra você. Imaginação e escrita incrível. Beijos, Evelin Damasceno.

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